Mediação no setor público e resolução consensual com o estado: base legal, experiências recentes e valor para negócios e terceiro setor

19.11.2025
.

A administração pública brasileira vem incorporando mediação e conciliação como política de Estado para reduzir litigiosidade, dar celeridade a controvérsias e melhorar a qualidade das soluções em temas de alta complexidade. A Lei 13.140 de 2015 estruturou a mediação entre particulares e disciplinou a autocomposição em conflitos que envolvam pessoas jurídicas de direito público. O Código de Processo Civil de 2015 reforçou essa diretriz ao colocar a consensualidade no centro do sistema e ao determinar a criação de câmaras de mediação e conciliação nos entes federados. Na esfera federal, a Câmara de Mediação e de Conciliação da Administração Pública Federal da Advocacia Geral da União consolidou procedimentos e publica bases normativas e termos de conciliação, evidenciando o amadurecimento institucional do método.

Marco jurídico e desenho institucional

A Lei 13.140/2015 autorizou a criação de câmaras de prevenção e resolução administrativa de conflitos no âmbito das advocacias públicas, com competência para dirimir controvérsias entre órgãos e entidades, avaliar a admissibilidade de pedidos de conciliação e promover termos de ajustamento de conduta quando couber. O CPC, no artigo 174, impôs a criação dessas câmaras e explicitou atribuições voltadas à solução consensual. Na União, o Decreto 11.328 de 2023 e atos posteriores detalharam competências da CCAF. Em 2025, a Portaria Normativa AGU 178 disciplinou estrutura e procedimentos internos da câmara, incluindo distribuição de casos, designação de mediadores e gestão de informações no sistema Sapiens. O conjunto normativo confere segurança jurídica, padroniza fluxos e deixa claros os pontos de controle e de responsabilização.

Casos e frentes de aplicação

A prática mostra massa crítica de controvérsias resolvidas por conciliação e mediação com reflexos econômicos relevantes. A própria AGU divulga acordos no âmbito da CCAF, como composições envolvendo Eletrobras e medidas de reparação socioambiental, além de conflitos federativos sensíveis. Em infraestrutura, a conciliação viabilizou a retomada de obras de acesso à Ponte de Integração Brasil Paraguai após pedido de reequilíbrio econômico-financeiro. Em telecomunicações e transportes, agências reguladoras e a AGU têm encaminhado divergências contratuais a instâncias consensuais com vistas à continuidade do serviço e à recomposição de equilíbrio. No contencioso previdenciário, o Supremo Tribunal Federal homologou acordos estruturais que fixam prazos para análise de benefícios e, em 2025, validou plano interinstitucional para ressarcir vítimas de descontos fraudulentos em aposentadorias e pensões do INSS, evidenciando amadurecimento de soluções coordenadas com controle judicial.

Vantagens e limites de legalidade

Os ganhos são tangíveis. A mediação reduz tempo de resposta em pleitos complexos, evita a deterioração de serviços públicos e favorece o cumprimento voluntário, com menor custo administrativo e judicial. Em contratos de concessão e PPP, acordos bem estruturados podem estabilizar expectativas, preservar investimentos e organizar reequilíbrios de forma transparente. Os limites também são claros. A autocomposição estatal exige pareceres jurídicos consistentes, respeito ao interesse público, observância de regras orçamentárias e de transparência e, quando aplicável, homologação judicial. Portarias e normas internas da AGU disciplinam admissibilidade, atuação de mediadores e registro de atos, ao passo que órgãos de controle e o Ministério Público verificam a legalidade e a economicidade. O objetivo é compatibilizar consensualidade com integridade institucional.

Como a consensualidade pública melhora as relações com empresas e terceiro setor

Para empresas que contratam com o poder público e para organizações do terceiro setor que celebram parcerias e termos de fomento, a abertura do Estado ao diálogo cria um trilho previsível para enfrentar impasses. A existência de câmaras administrativas especializadas e de procedimentos padronizados diminui assimetria informacional, acelera renegociações e confere rastreabilidade a concessões de reequilíbrio e a ajustes de desempenho. Nos casos de demandas repetitivas, como benefícios previdenciários ou controvérsias regulatórias em massa, acordos estruturais evitam decisões fragmentadas e alinhavam cronogramas, critérios e métricas de execução. O resultado é mais segurança jurídica, mais continuidade do serviço e menor custo de transação para todos os envolvidos.

Boas práticas para desenhar e participar de mediações com o Estado

Três frentes de governança elevam as chances de sucesso. A primeira é preparar o dossiê técnico e econômico com evidências auditáveis que sustentem a proposta. A segunda é alinhar a estratégia ao marco legal e às normas internas da advocacia pública competente, identificando desde logo a necessidade de homologação judicial e de controle externo. A terceira é propor cronogramas factíveis e critérios de monitoramento que facilitem o cumprimento e a prestação de contas, inclusive com cláusulas de reavaliação periódica. Em concessões, a coexistência entre canais administrativos de recomposição e eventuais arbitragens reguladas exige coordenação procedimental e transparência com as agências e cortes de contas.

Conclusão

Mediação e conciliação com o Estado deixaram a teoria e entraram na rotina de gestão pública. A Lei 13.140/2015, o CPC e a institucionalização da CCAF e de câmaras análogas nos entes subnacionais criaram a infraestrutura jurídica para soluções rápidas, controladas e auditáveis. Experiências em infraestrutura, mercado regulado e previdência demonstram que a consensualidade reduz litígios, preserva serviços e dá previsibilidade a investimentos. O caminho passa por pareceres sólidos, critérios de transparência e respeito ao interesse público. Para empresas e organizações sociais, trata se de oportunidade concreta para resolver divergências com eficiência, sem abrir mão da segurança jurídica que o controle institucional assegura.

Compartilhe

Assine nossa newsletter